Entre março e setembro de 2025, o Instituto Moreira Salles de Poços de Caldas apresenta a exposição Dignidade e Luta: Laudelina de Campos Mello. A partir da trajetória de Laudelina — mulher negra, trabalhadora doméstica, ativista e fundadora do primeiro sindicato da categoria no Brasil —, a mostra revisita as raízes escravocratas do trabalho doméstico e suas permanências nas estruturas sociais contemporâneas.
Como desdobramento da exposição, o artista Alberto Pereira, representado pela Aborda, realizou uma residência no IMS entre os dias 17 e 21 de março. A convite da equipe curatorial da mostra, composta por Raquel Barreto, Renata Sampaio e Phelipe Rezende, e em articulação com o setor de Educação do Instituto, sob consultoria de Samantha Moreira, Pereira coordenou um processo coletivo com artistas urbanos de Poços de Caldas, voltado à criação de obras públicas inspiradas na figura e no legado de Laudelina.
Com a colaboração do arte-educador, escritor de graffiti e dançarino Leonardo Gonçalves (SERÁ), artista atuante na cena local, foram convidados a participar do projeto Ayba Rasta, Be VHLL Moterani e Tibor Fuhara. O grupo desenvolveu vinte intervenções em vasos de plantas, nas quais a imagem de Laudelina foi elaborada por meio de técnicas como colagem, estêncil, lambe-lambe, pintura e pixação. As obras foram finalizadas com o plantio coletivo de espadas-de-São-Jorge, com o apoio do jardineiro Lezio Vieira, integrante da equipe do Instituto.
A participação de Pereira também reverbera na exposição, na qual apresenta a obra Supernanny Brasil (2016). Nela, por meio de colagem digital, o artista insere o rosto de Anastácia, mulher escravizada retratada no século XIX pelo pintor francês Jacques Étienne Arago, no corpo de uma babá contemporânea. O gesto instaura um deslocamento crítico: sobrepõe passado e presente para evidenciar a persistência da lógica colonial nas relações de trabalho, sobretudo nas atividades de cuidado, tradicionalmente atribuídas às mulheres negras.
Anastácia, embora envolta em controvérsias quanto à sua origem, tornou-se um dos ícones populares da resistência negra no Brasil. Conforme explica Aline Moraes, curadora da Aborda: “a origem e a própria existência de Anastácia são múltiplas. Algumas fontes indicam que teria nascido no Brasil; outras, que teria vindo da África. Nas narrativas populares, conta-se que foi castigada com a máscara de flandres, peça de aço utilizada para impedir a alimentação, por recusar relações sexuais com seu explorador. Também é lembrada como curandeira, com milagres atribuídos aos seus cuidados. Apesar de não canonizada pela Igreja Católica, é reverenciada em diversas religiões de matriz brasileira.”
Durante a escravidão, mulheres negras foram sistematicamente destinadas às tarefas domésticas: cozinhar, limpar, cuidar dos filhos das elites. Mesmo após a abolição, em 1888, essas funções continuaram a ser exercidas sob condições de subalternidade. A ausência de políticas reparatórias no pós-abolição consolidou uma exclusão estrutural, que se manifesta ainda hoje na informalidade e na precarização do trabalho doméstico, majoritariamente desempenhado por mulheres negras.
A exposição, a ação coletiva e o trabalho artístico de Pereira propõem uma leitura crítica dessas permanências, convidando o público a reconhecer os processos históricos que sustentam a desigualdade contemporânea e a imaginar, por meio da escuta e da participação, outras formas de luta e reparação simbólica.
Sobre a Aborda
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